Resumo

A água é um recurso imprescindível ao desenvolvimento socioeconômico de uma nação. Porém, os efeitos da destruição do meio ambiente apontam para uma crise epistêmica cujos efeitos já são notados no âmbito dos recursos hídricos (WOLKMER; PIMMEL, 2013). No contexto da região semiárida brasileira, em especial, as características intrínsecas do processo de gestão das águas a tornam altamente sensível e dependente de um sistema de governança multinível, apoiado em ações que assegurem o gerenciamento da água de forma sustentável, integrada e inclusiva (OCDE, 2015).

Diante da possibilidade de escassez hídrica em diversas regiões do mundo, estudos apontam para a governança como um dos desafios mais relevantes ao aprimoramento da gestão de recursos hídricos, já que estruturas de governança voltadas à promoção do uso múltiplo e sustentável da água permitem o acesso a ela e a implementação de políticas, por meio da responsabilidade compartilhada entre diferentes stakeholders (THEODORO; MATOS, 2015). Assim, o presente estudo se propôs analisar o processo de governança da água do açude do Bitury, situado na bacia hidrográfica do rio Ipojuca, em Pernambuco.

De acordo com Lanna (2014), a gestão de recursos hídricos é uma atividade que visa promover o inventário, uso, controle e proteção dos recursos hídricos. Por sua vez, a governança da água é definida como sendo um conjunto de políticas, práticas e processos — de caráter formal e informal — por meio dos quais as decisões são tomadas, as partes interessadas podem articular seus interesses e ter suas preocupações consideradas, e os órgãos gestores são responsabilizados pela gestão da água (OCDE, 2015).

No estudo foi utilizada uma abordagem metodológica com predominância qualitativa, norteada por paradigmas compreensivos. Tratou-se de um estudo de caso exploratório e descritivo, sendo o corpus da pesquisa constituído de: (i) pesquisas bibliográfica e documental e (ii) entrevistas semiestruturadas. Adotou-se como espaço referencial da pesquisa o do açude do Bitury, situado na bacia hidrográfica do rio Ipojuca, em Pernambuco. As entrevistas foram realizadas com 10 sujeitos, no período de outubro de 2020 a fevereiro de 2021 e foram tratadas por meio de análise de conteúdo simplificada.

Os principais resultados obtidos foram: os papéis e responsabilidades dos órgãos gestores são claros, porém, as práticas de gestão não são compatíveis, em sua totalidade, com as condições da microbacia; os atores demonstram possuir competências técnicas e os dados e informações produzidos demonstram ser consistentes, mas, a aplicação de recursos financeiros na bacia é deficitária; e a alocação de água é realizada na gestão do açude, contudo, é preciso maior transparência e envolvimento dos atores, assim como ampliar as ações de fiscalização no sistema de governança.

O processo de governança da água no açude do Bitury, do ponto de vista normativo, não demonstra possuir falhas ou lacunas significativas. Porém, o exercício das capacidades legais por parte dos atores envolvidos na gestão do reservatório não ocorre em plenitude, uma vez que se verificam fragilidades e desafios notórios que necessitam de intervenções, em especial, nas áreas de: capacitação técnica, financeira e institucional; transparência e integridade; adoção de práticas inovadoras; articulação das políticas públicas implementadas no entorno do açude; e comprometimento dos stakeholders.

LANNA, A. E. Gestão de recursos hídricos. In: TUCCI, C. E. M. (Org.). Hidrologia: ciência e aplicação. Porto Alegre: Editora da UFRGS/ABRH, 2014. p. 727-768. OCDE. Princípios da OCDE para a governança da água. [sine loco]: OECD Publishing, 2015. THEODORO, H. D.; MATOS, F. (Orgs.). Governança e recursos hídricos: experiências nacionais e internacionais de gestão. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2015. WOLKMER, M. F. S.; PIMMEL, N. F. Política Nacional de Recursos Hídricos: governança da água e cidadania ambiental. Sequência, v. 34, n. 67, p. 165-198, 2013.