Resumo

A importância das cidades e seu potencial para enfrentar as mudanças climáticas e para transformar os sistemas locais de energia, transporte e mobilidade, tem sido contemplada nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), especificamente no “Objetivo 11: Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis” (ONU, 2018). Para este objetivo foram estabelecidas metas específicas para o ano 2030, que contemplam a priorização do transporte público e a necessidade de reduzir os problemas associados à qualidade do ar.

Para alcançar este objetivo, é necessário realizar mudanças nos sistemas dominantes do transporte terrestre, os quais têm um grande impacto nas emissões de gases poluentes, e promover uma “transição para uma mobilidade de baixo-carbono”. Dentro do conjunto de alternativas que podem contribuir com esta transição, este artigo tem como objetivo principal: “Analisar o papel das cidades para estimular a inserção do Nicho dos Ônibus de Baixa-Emissão e sua contribuição para uma transição para uma mobilidade de baixo-carbono no Brasil”.

Foi utilizado como marco analítico-conceitual as Transições para a Sustentabilidade e a Perspectiva Multi-Nivel, e seus níveis de análise se caracterizaram para o caso Brasileiro. A Perspectiva Multi-Nivel (MLP), argumenta que as Transições acontecem através de interações em três níveis de análise: a) Nível Macro: Panorama Sócio-Técnico (Socio-Technical Landscape); b) Nível Meso: Régime Sócio-Técnico (Socio-Technical Regime); e c) Nível Micro: Inovações de nicho (Niche Innovation) (Geels, 2002).

A metodologia da presente pesquisa está centrada numa análise qualitativa que mistura as seguintes ferramentas metodológicas: i) Revisão Bibliográfica; ii) Entrevistas em Profundidade; iii) Trabalho de Campo. As entrevistas e trabalhos de campo permitiram coletar informações de fontes primarias dos stakeholders associados ao transporte público e à mobilidade urbana no Brasil. Foram feitas vinte-cinco (25) entrevistas entre 2016-2018. O trabalho de campo consistiu em onze (11) visitas técnicas para conhecer os projetos demonstrativos no Brasil e na participação de eventos setoriais.

Foram caracterizados os três níveis de análise da MLP. No nível macro, há um conjunto de políticas que estão presionando mudanças no nível de regime e do nicho. No nível de nicho, a inserção dos ônibus de baixa-emissão no Brasil tem estado associada a projetos piloto e demonstrativos. Estes projetos funcionam como experimentos ou “lócus de aprendizagem”, para os diferentes atores que participam como governos locais, empresas de energia, universidades, centros de P&D, empresas de ônibus e de componentes, operadores de frota, entre outros e são financiados por entidades do governo nacional.

As cidades são fundamentais para direcionar processos de transição, já que têm a autonomia para estabelecer políticas meio-ambientais e mecanismos para organizar a mobilidade urbana e o transporte público. No Brasil, o processo da Licitação do Sistema de Transporte Público Coletivo de São Paulo, se constitui numa “janela de oportunidade” para incorporar ônibus de baixa-emissão em grande escala, devido ao estabelecimento de metas rígidas de redução de emissões. Assim, as cidades se constituem em agentes ativos que lideram intencionalmente as transições para uma mobilidade de baixo carbono.

Geels, F. W. (2002). Technological transitions as evolutionary reconfiguration processes: a multi-level perspective and a case-study. Research Policy, 31(8–9), 1257–1274. Geels, F. W. (2012). A socio-technical analysis of low-carbon transitions: introducing the multi-level perspective into transport studies. Journal of Transport Geography, 24, 471–482. Geels, F. W. (2018). Low-carbon transition via system reconfiguration? A socio-technical whole system analysis of passenger mobility in Great Britain. ONU (2018). Objetivo 11. Cidades e comunidades sustentáveis.