Resumo

Título do Artigo

TRANSIÇÃO DA ECONOMIA LINEAR PARA ECONOMIA CIRCULAR COMO VALOR DOS GOVERNOS MUNICIPAIS
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Tema

Operações sustentáveis e Economia Circular

Autores

Nome
1 - GUSTAVO LIMA CEZARIO
UNB Universidade de Brasília - PPGA Responsável pela submissão

Reumo

Ao contrário dos avanços esperados na popularização e na consolidação do conceito de Economia Circular, o Circularity Gap Report 2023 indicou um aumento da extração de materiais responsável pelo encolhimento da circularidade da economia global de 9,1% em 2018 para 7,2% em 2023. Seguimos dentro da lógica de uma economia linear de extrair, consumir e descartar (take-make-dispose), com enorme desperdício de recursos naturais finitos que não retornam para novos ciclos econômicos (take-make-return). Na academia, pesquisadores consideram que a transição para Economia Circular (EC) está apenas começando (GHISELLINI; CIALANI; ULGIATI, 2016; KIRCHHERR; REIKE; HEKKERT, 2017). SegundoVieira e Guarnieri (2023), estudos empíricos e teóricos têm se concentrado na adoção no nível micro ao invés de um processo de transição, sendo necessário abordar mais as interações dos responsáveis pela legislação e formulação das políticas públicas, indicados como barreiras para a referida transição. A ampla aliança de stakeholders comprometidos em acelerar este processo de transição deve alcançar os governos locais, principalmente na federação brasileira em que estes entes têm autonomia e significativas competências sobre o tema. A lacuna a ser respondida pelo presente estudo é sobre este baixo engajamento do poder local, diante da pergunta sobre como deve ocorrer o processo da transição para EC nos municípios brasileiros. Este processo geralmente se confunde com a gestão de resíduos (GHISELLINI; CIALANI; ULGIATI, 2016). Apesar da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) determinar a disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos até 02 de agosto de 2024 para todos os portes populacionais, as taxas de reciclagem indicadas pelo poder público foram praticamente inalteradas nos últimos quinzes anos e quase metade dos munícipios ainda possuem lixão ou aterro controlado. A fim de alcançar a efetiva transição para EC a luz das competências municipais, busca-se analisar a aderência das 24 estratégias propostas por Guarnieri (2023), assim como das dimensões indicadas no relatório Economia Circular em Cidades e Regiões (OCDE, 2020). Antes de definir o grau de engajamento do município em cada uma dessas alternativas, é necessário identificar os valores destes atores. Como parte do Método de Estruturação de Problema (PSM), a abordagem Value Focused Thinking – VFT é apropriada nesses contextos em que não há clareza sobre os objetivos pretendidos, tendo na definição dos desejos a serem alcançados um guia para os tomadores de decisão (KEENEY, 1996). Para se obter uma melhor compreensão do problema e auxiliar na especificação mais precisa das consequências e restrições envolvidas, realiza-se entrevistas com as partes envolvidas para explicitação dos valores (GUARNIERI, 2012). Françozo e Belderrain (2022), ao analisar práticas mais frequentes na literatura, sugerem uma estrutura de VFT em quatro passos capaz de garantir consistência metodológica. O artigo inicia com análise do conceito de Economia Circular, com foco na revisão sistemática realizada por Kirchherr et al. (2017; 2023), tendo como pano de fundo a Teoria de Stakeholders. Em seguida, aborda-se estratégias nacionais de transição para Economia Circular, sobretudo as identificadas na revisão sistemática da literatura de Guarnieri et al (2023). O modelo proposto pela OCDE (2020), ao abordar indicadores de governança pública no âmbito local, demonstrou-se o mais consistente do levantamento bibliográfico para responder à pergunta de pesquisa já apresentada. A aplicação do VFT é descrita na seção de procedimentos metodológicos. A seção análise e discussão dos resultados demonstra em que medida as alternativas propostas na literatura são aderentes aos valores das partes interessadas, tendo como limitação o espectro explicitado nas três entrevistas realizadas. A conclusão é que a transição para Economia Circular no contexto brasileiro passa necessariamente pelo engajamento dos governos municipais. Apesar de grande parte das estratégias indicadas por Guarniere et al. (2023) estarem previstas na Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), é preciso ir além destas obrigações legais, alcançando uma governança pública capaz de mobilizar atores privados pela cidadania global. As dimensões de governança propostas pela OCDE demonstraram que algumas estratégias são mais aderentes as responsabilidades dos governos municipais. Todavia, os custos municipais na gestão de resíduos sólidos serão reduzidos na medida em que estes conseguirem ser exemplo de liderança no setor e estabelecer Planos Estratégicos de Cidades Circulares capazes de gerar mudança cultural dos atores privados. A abordagem do VFT foi capaz de organizar de forma criteriosa os valores de tomadores de decisão relacionados aos governos locais, demonstrando objetivos fundamentais de governança pública e cidadania global. Em todos os objetivos identificados no diagrama de afinidade, há um papel a ser desempenhado por gestores públicos municipais, sendo natural compreender o vínculo maior com os objetivos da governança pública. A inclusão socioprodutiva é apresentada como ponto de inflexão em que o poder público passa a atuar como agente organizador da cadeia produtiva e sensibilizador da cidadania climática, determinante para a contabilização e formalização do grande trabalho invisível de reciclagem, principalmente nos municípios de maior porte populacional. Regulamentação da lei do grande gerador, cobrança de PGRS para o licenciamento ambiental das empresas, estabelecimento de acordos com as entidades setoriais são exemplos de práticas que engajam atores privados. Se as dimensões de governança são mais aderentes para o bloco dos primeiros três objetivos fundamentais, outros indicadores do inventário da OCDE de Economia Circular (econômico e negócios, meio ambiente, infraestrutura e tecnologia) podem ser adequados para avaliar o papel do poder municipal na sensibilização de atores privados pela cidadania global. Os benefícios socioeconômicos e a maior consciência sobre a sobrevivência da espécie humana no planeta Terra transformarão cada vez mais a Economia Circular em ativos que dependerão de avanços na contabilidade ambiental e mecanismos de transação financeira dos serviços ecossistêmicos. A regulamentação de novas formas de financiamento, a exemplo de commodities ambientais como crédito de mercado, indica um futuro promissor para esta transição que só está começando. É determinante para catalisar este processo o maior envolvimento dos governos municipais, atuando tanto no âmbito da governança pública, quanto na formação da nova economia verde.