Reumo
Nos últimos anos, a extração de lítio tornou-se um foco de interesse global, principalmente por sua eficácia na fabricação de baterias de longa duração, fundamentais para veículos elétricos que, por consequência, contribui para a redução de emissões de poluentes. Temos a chamada “transição energética”. O Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, Brasil, concentra as principais reservas de lítio do país e tem sido rebatizado como o “Vale do Lítio” devido ao crescente interesse por essa atividade mineral. Historicamente associada à pobreza, a região agora é promovida pelo governo como o “Vale da Esperança”, prometendo empregos e desenvolvimento. Entretanto, essa nova realidade gera sentimentos mistos entre os locais, que veem oportunidades econômicas, mas também temem possíveis impactos negativos, como perda de terras e danos ambientais. Neste sentido, este estudo tem como objetivo analisar como a exploração do lítio no Vale do Jequitinhonha foi discutida em uma audiência pública realizada em 5 de julho de 2024, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em Belo Horizonte. A análise foca nas preocupações das comunidades locais, utilizando a perspectiva da sociologia das mobilizações coletivas conforme teorizado por Cefaï (2009; 2017), Rocha (2017) e Andion et al. (2017). A sociologia das mobilizações coletivas, propõe o desenvolvimento de uma sociologia dos regimes de ação, a reativação da noção de “público”, a concepção de redes e organizações como arenas de experiência e ação, e a formação de experiências individuais e coletivas. A partir do entendimento de que, os problemas e seus públicos se constituem mutuamente em diferentes arenas, onde a ação pública emerge das relações entre atores individuais e coletivos (ANDION et al., 2017). Para a metodologia, foi adotada uma abordagem qualitativa e descritiva por meio da análise temática. A audiência pública foi transcrita integralmente e posteriormente, analisado no software Atlas-TI, permitindo uma codificação sistemática que identificou os problemas denunciados pelos convidados. A audiência pública contou com a presença de lideranças indígenas, quilombolas e comunitárias que denunciaram violações de direitos, falta de consulta pública e impactos negativos da mineração. Problemas como poluição do ar, doenças respiratórias, poluição sonora e danos estruturais às casas foram destacados, acompanhados por preocupações socioeconômicas e ambientais. A extração de lítio tem causado poluição do solo e da água, aumento de temperaturas, e comprometimento do abastecimento de água, bem como o comprometimento de serviços públicos essenciais, resultando em superlotação de hospitais e aumento da violência. A audiência pública levou a algumas ações, como a solicitação de assessoria técnica independente para as famílias afetadas, visitas às comunidades impactadas, e a exigência de que o governo considere as demandas locais e respeite os direitos de consulta dos povos tradicionais. O estudo evidenciou a importância dos denunciantes em mobilizar e divulgar questões ambientais e sociais, pressionando por soluções e responsabilização dos atores envolvidos. Os achados destacam que, enquanto a exploração de lítio no Vale do Jequitinhonha promete benefícios econômicos, as preocupações socioambientais destacadas pela audiência pública precisam ser abordadas de forma integrada, considerando a voz das comunidades afetadas e a proteção de seus direitos. Sugere-se para futuras pesquisas, que se aprofundem nos relatos dos moradores, utilizando entrevistas e estudos etnográficos para uma compreensão mais abrangente do fenômeno.